06
Sep14
04
Sep14
Partidas: tio Alberto
Morreu ontem o tio Alberto, casado com tia Elcy, irmã de minha mãe. E com ele um pedaço da minha infância. Tio Alberto está presente nas minhas lembranças de menino como aquela figura confiável que ajudava a garantir a estabilidade do universo. Médico de origem portuguesa, viveu décadas com a esposa e o filho em um sobrado de dois pisos em Niterói, onde passei algumas férias. Homem de fala pausada, tinha um jeito doce, ponderado e avesso a conflitos. Essa característica de contemporizar às vezes lhe trouxe grandes dissabores, que enfrentava com estoicismo. Adorava ler, conversar de filosofia, ajudar quem precisava. Seu conhecimento de inglês me incentivou desde pequeno a aprender a língua. Passei belos momentos no sossego da sua biblioteca, cheia de tesouros. Nos últimos anos, enfrentou sérias dificuldades familiares, como o Alzheimer que levou sua companheira e outros problemas que não me cabe descrever. Falei com tio Alberto pela última vez em 2011, quando estive no Rio e trocamos dois telefonemas. O primeiro pra combinar um almoço, o segundo em que cancelei o encontro, pra não perder um avião. Eu devia ter mudado aquele voo, mas não tinha como adivinhar. Fica a lembrança de um homem digno, cuja grandeza de alma é proporcional ao modo discreto e simples com que viveu. RIP.
15
Jul14
Complexo industrial da saúde atrai investimentos para o Brasil
Reportagem que publiquei no Valor em 7 de abril.
O Brasil é um destino promissor para corporações que atuam com produtos e equipamentos de saúde. Com 13 mil empresas que faturam R$ 16 bilhões e crescem em média 10% ao ano, o país ocupa a sétima posição neste mercado, atrás apenas da China entre os países emergentes. Grandes grupos multinacionais têm realizado aquisições e implantado fábricas aqui para apoiar suas estratégias, o que abre oportunidades para fornecedores locais. O crescimento da demanda por bens e serviços de saúde se deve em parte à elevação da renda e à sua melhor distribuição. Outro motivo é o envelhecimento dos brasileiros. As doenças crônicas e degenerativas, que requerem mais equipamentos de diagnóstico e tratamento precoce, já correspondem a dois terços das enfermidades no país. (…)
14
Jul14
Inovações reduzem retrabalho no canteiro
Reportagem que publiquei em março no Valor Econômico.
Novas tecnologias adotadas na construção civil estão chegando aos canteiros de obras, com benefícios para construtoras, trabalhadores e consumidores. As inovações abrangem de técnicas construtivas a sistemas de gestão de projetos; de máquinas que aumentam a segurança dos operários ao reaproveitamento de materiais reciclados. Para as empresas, as vantagens incluem a redução nos custos e prazos de entrega, a valorização dos empreendimentos e o aumento da competitividade em licitações públicas. (…)
13
Jul14
Copa 2014, um roteiro dos deuses
E hoje termina a Copa do Mundo de 2014. Lá no Olimpo da bola, os deuses roteiristas deste mundial estão inspirados. Derrubaram dois ou três monstros sagrados, elevaram seleções inexpressivas ao estrelato, adicionaram pitadas de canibalismo, traves no meio do caminho, injustiças, oportunismo político, apelo ao heroísmo, reversões de expectativas, lágrimas e consolações, piadas incríveis, thriller policial com fuga, teorias da conspiração, atos covardes e generosos, jogadas de marketing, pedidos de asilo, belíssimas panorâmicas com figurantes de todas as cores e sotaques. E bom futebol. Vi várias partidas bem jogadas – nenhuma foi do Brasil. Considerando o conjunto da obra, não dá pra me queixar. Que venha neste domingo um epílogo de tirar o fôlego. Sei que a memória é fraca e seletiva, mas espero lembrar da Copa de 2014 não só como a da destruição do mito da invencibilidade canarinha, que já não nos serve faz tempo, mas como um grande espetáculo.
06
Jun14
31
May14
30
May14
No caixa eletrônico
Crônica da amiga Adriane Canan, uma mestra na arte da observação do cotidiano.
no caixa eletrônico, bem ao lado do meu:
- ai, errei de novo!
- eu disse pra ti, tu és um tanso. tásh com oitenta anos na cara e não acerta a senha uma vez. deixa pra mim que eu sou mais nova.
ela, uns 70, talvez, toma o lugar dele e começa a tocar a tela do caixa eletrônico.
- como é mesmo a senha?
ele fala baixinho no ouvido dela. ela toca a tela.
- ai, não deu outra vez. culpa tua, não me dissessi direito!
- claro que eu disse -, ele revida e dá uma tossida forte.
- agora tu vásh entrar e pagar lá dentro. três erros a máquina devolve o cartão, já sabesh. vou te esperar ali fora, naquele banquinho, no sol.
ele vai, paciente, até a porta giratória.
- João Carlos -, ela grita.
me assusto, ele também.
- já sabesh que não podes entrar por aí, né? e o marca-passo? o guarda abre pra ti, vai ali, ó.
ele vai, devagar, pra outra porta. ela olha pra mim:
- tenho que cuidar bem, tadinho.
21
May14
A irmandade da uva
Era pra ser só uma passada rapidinha na livraria, mas ele me fisgou. Recém-lançado no Brasil, The brotherhood of grape é de 1977. John Fante era o escritor favorito de Bukowski, que dele dizia: “Finalmente alguém que não tem medo da emoção”. Sem dúvida ele dominava o ofício como poucos.
O romance mais conhecido de Fante, e provavelmente o melhor, é Pergunte ao pó, em que seu alter-ego Arturo Bandini tenta fazer sucesso na Los Angeles dos anos 30, enquanto mata a fome com laranjas em um hotel barato e vive uma paixão complicada com uma garçonete mexicana. Humor e lirismo com muita arte.
O livro foi traduzido pro português por ninguém menos que Paulo Leminski, que, no prólogo, descreve a aventura dessa transcriação. Algumas sutilezas só funcionavam em inglês, lembrava Leminski, como a frase “I was twenty then”, fundamental pra definir o perfil do protagonista (“Eu tinha vinte anos então”. ou “Eu era vinte…”).
Também gosto muito de O vinho da juventude, em que ele recupera, com um tom bem-humorado e agridoce, as lembranças da infância e adolescência numa família de imigrantes italianos. E 1933 não foi um ano bom, também focado na família, com destaque para o seu pai, um pedreiro orgulhoso e durão.
Recomendo Fante a todos que gostam de ler bons romances em que o escritor coloca sua alma, sem floreios ou artifícios literários.
Depois conto o que achei deste.
20
May14
Conversas com Maria Adélia Aparecida de Souza
Algumas anotações de um seminário na UFSC com a brilhante geógrafa Maria Adélia Aparecida de Souza, 75 anos e 54 de academia, professora titular da USP na área de planejamento urbano. Orientanda de Celso Furtado, ela é considerada herdeira do trabalho de Milton Santos. Depois do seminário, realizado na quarta 14/5, tive ainda o privilégio de acompanhar na sexta-feira sua arguição a uma tese de doutorado na Geografia (contundente, mas generosa e bem-humorada) e acompanhá-la numa visita de campo a Rancho Queimado. Foi uma semana valiosa.
Sustentabilidade
“Nada se sustenta! As pessoas precisam deixar de ser cínicas. O capitalismo é movido pela insustentabilidade”.
Educação ambiental
“O problema não está no mico-leão, está na voracidade das elites do mundo, que não respeitam a vida”.
O lugar e a vida
“Duas semanas antes de morrer, Milton me disse: ‘Por favor, cuide da questão do lugar’. O ponto de partida da geografia renovada é o significado de lugar. Nele nasce a vida de relações, logo a região, o mundo, toda a complexidade contemporânea. O lugar é a síntese da dinâmica do mundo nas relações sociais”.
“A descrição é sempre passado. O lugar não é morto, portanto, não é passível de descrição”.
Mobilidade urbana
“Para estudar mobilidade, deve-se considerar a segregação socioespacial”.
Críticas à academia
“A gente (geógrafos) não conhece absolutamente nada sobre como os pobres estão se virando nas periferias das cidades”.
“Eu responsabilizo os professores universitários pela decadência da universidade brasileira. Depois vêm os alunos, que abraçaram a mediocridade.”
“Publicar artigo com aluno é uma imoralidade, a não ser que ele já tenha doutorado. O aluno tem que ter a segurança de caminhar sozinho”.
“Os medíocres se agarram na forma”.