09
Oct16
Leitura iniciada: 14 contos de Kenzaburo Oe
Nobel de Literatura em 1994, o escritor japonês de 81 anos era um completo desconhecido pra mim até hoje cedo. Encantamento instantâneo. Descobri também que fazemos aniversário no mesmo dia.
27
Jun16
18 links de referência de meu bookmark
Boa ferramenta pra estimular a associação de ideias. Traz significado, sinônimos, palavras relacionadas, expressões, citações, verbetes da wikipedia e imagens, tudo numa única página.
Arquivo pdf com 27 páginas e a íntegra do acordo que até hoje deixa a gente confuso.
A palavra buscada vira um mapa mental de conceitos relacionados. Tem mais de 150 mil palavras e 120 mil significados. O serviço é por assinatura, mas pode ser testado de graça.
Bom dicionário inglês-inglês com seções interessantes: palavra do dia, tradução, games e blog.
Organizado por Lúcia Gaspar, bibliotecária da Fundação Joaquim Nabuco, este artigo traz uma lista interessante de termos do esporte bretão, ultimamente tão mal jogado por aqui.
Biblioteca com milhões de livros, filmes, softwares, músicas e websites. Sua ferramenta Wayback Machine permite localizar o histórico de 491 bilhões de páginas na internet.
Seleção organizada pelo site Livros e Afins, da qual peguei alguns dos indicados acima.
14
Apr16
Paz para los crepúsculos que vienen
30
Dec15
A matemática de amassar barro com as costas
Você pode achar esta calculadora de probabilidades um tanto mórbida. Prefiro vê-la como um exercício de riso filosófico — meu pai costumava fazer isso anotando as idades em que as personalidades da enciclopédia abotoaram o paletó. Na comparação, ele se considerava um homem de sorte. Cumpriu sua missão aos 85 anos, quando 70,2% das pessoas já dormiram o sono dos justos, segundo os matemáticos.
Se você só tem 25 anos, a possibilidade de esticar o pernil é de apenas 0,3%. Somos praticamente imortais nesta idade, aproveite — mas não abuse da paciência do anjo da guarda, que às vezes é ruim em matemática. Já as chances de arrefecer o céu da boca antes dos 50, idade que completo no mês que vem, são um pouco mais altas: 3,6%. Se depender de mim, não pretendo estar entre os 99,6% que já bateram biela antes de completar cem anos.
Já pensou em como pode ser reconfortante ter a consciência de que nosso corpo não foi feito pra durar? A gente pode se dedicar de alma muito mais leve aos amigos, beijos de língua, amores, viagens, atos solidários ou solitários, à realização de pequenos e grandes sonhos. E, claro, a chutar o balde do que não nos interessa. Um momento de cada vez, sem auto-ilusão e sem se estressar com o triste pio. É o que temos.
Afinal, pra que se preocupar com o dia de dar o peido mestre, sair com os pés pra frente, ter a conta feita, dar o couro às varas, fazer tijolo, ir para o jardim das tabuletas, amassar o barro com as costas, dar com a cola na cerca, morder o pó, perder a colher, colocar o pijama de madeira, esticar o alcatre, desconectar geral, mudar pra cidade dos pés juntos, se isso está fora do nosso controle? Carpe diem e feliz 2016!
~
Esta crônica foi inspirada no texto Your body wasn’t built to last: a lesson from human mortality rates
29
Dec15
Leituras de 2015: DVeras Awards
Compartilho com os viciados em livros a minha lista de leituras concluídas em 2015. A maioria é de ficção e está numerada mais ou menos na ordem cronológica em que me chegou às mãos. Ficam de fora as leituras de trabalho e as obras que venho degustando aos golinhos – como O som e a fúria, de Faukner, denso e multifacetado; Um prazer fugaz: cartas de Truman Capote, interessante, mas desigual; e Voces de Chernóbil, reportagem da Nobel de literatura Svetlana Alexievich, de uma humanidade devastadora, ainda sem tradução pro português. Incluí dois contos de García Márquez, um de Bolaño e um de Chandler pescados na internet, pequenas obras-primas que valem por livros inteiros. Os de Gabo têm títulos fantásticos de bons.
O resultado compõe uma boa variedade de estilos, temas e nacionalidades – são 29 representantes dos Estados Unidos, Brasil, Japão, Suécia, Chile, Peru, Colômbia, Escócia, Itália e Canadá. Todos à sua maneira me fizeram companhia amiga ao longo deste ano bruto que já vai tarde. Com esses autores e autoras, viajei sem sair da minha rede no quintal. Tangi gado no lombo de um burrinho em Minas (26). Bebi feliz com amigos poetas em Lima (18). Toquei no colo de Evita na Casa Rosada (13). Conheci uma estranha sedutora em Istambul. Fui abduzida enquanto me prostituía (15). Testemunhei um duplo homicídio em Moçambique (7). Encarei a espera e a solidão num apartamento de Santiago (6). Tive uma lua-de-mel inesperada em Paris (8). E no Rio, amei uma mulher de aliança que não era o que parecia… (25)
Difícil apontar meus favoritos do ano. Mas listas servem pra isso mesmo: despertar curiosidade, motivar outras listas, criar polêmica. E também para dar uma ilusória sensação de ordem no meio do caos. Sigo a brincadeira do DVeras Awards de anos anteriores e aponto os top 3 de 2015 em negrito – mas vamos combinar que Guimarães Rosa, Rubem Braga, Gabo e John Fante são hors-concours, tá? Ao final, faço um breve comentário sobre as escolhas e anuncio o campeão do ano. Boas leituras.
- Pacto Sinistro (Patricia Highsmith)
- Recado de Primavera (Rubem Braga)
- Tudo é eventual (Stephen King)
- 1933 foi um ano ruim (John Fante; releitura)
- Caçando carneiros (Haruki Murakami)
- A vida privada das árvores (Alejandro Zambra)
- O homem de Beijing (Hennig Mankell)
- El rastro de tu sangre en la nieve (Gabriel García Márquez)
- A zona do desconforto (Jonathan Franzen)
- Sensini (Roberto Bolaño)
- O homem que virou fumaça (Maj Sjowall e Per Wahloo)
- A quinta mulher (Hennig Mankell)
- A quiet flame (Philip Kerr)
- El tren (Raymond Chandler)
- Contos fantásticos: amor & sexo (Bráulio Tavares, org.)
- Noites do sertão (Guimarães Rosa)
- Meus desacontecimentos: a história da minha vida com as palavras (Eliane Brum)
- Contarlo todo (Jeremías Gamboa)
- Número Zero (Umberto Eco)
- A grande fome (John Fante)
- A garota na teia de aranha (David Lagercrantz)
- Punto de fuga (Jeremías Gamboa)
- F (Antonio Xerxenesky)
- Sobre a escrita: a arte em memórias (Stephen King)
- Histórias curtas (Rubem Fonseca)
- Sagarana (Guimarães Rosa; terceira releitura)
- En este pueblo no hay ladrones (Gabriel García Márquez)
- Sobre encontrarse a la chica 100% perfecta una bella mañana de abril (Haruki Murakami)
- Ódio, amizade, namoro, amor, casamento (Alice Munro)
Sobre a escrita é o relato da trajetória de Stephen King no universo da linguagem, desde a infância à consagração como um dos grandes talentos da literatura fantástica. O livro traz orientações preciosas para quem pretende escrever profissionalmente. Pode acreditar, o homem sabe do que fala. Um de seus conselhos: “Você pode abordar o ato de escrever com nervosismo, excitação, esperança ou desespero. Faça isso de qualquer forma, menos sem seriedade”. “A narrativa tem também uma parte confessional para quem busca entender os bastidores do processo criativo do autor e as dificuldades que ele enfrentou. Muito bom.
Contarlo todo, romance de estreia do peruano Jeremías Gamboa, me impressionou pela fluência com que relata a vida do jovem protagonista, morador da periferia de Lima que resolve seguir o jornalismo e depois troca a profissão pela de escritor. A sensação de não-pertencimento, a busca do sonho, a cumplicidade dos amigos, as armadilhas do amor e da solidão, ingredientes frequentes nos romances de formação, aparecem de maneira original e cativante. Devorei o livro pouco tempo depois de uma viagem ao Peru. Meu prazer com essa leitura também se deve às identificações pessoais que tive com a história – o cotidiano das redações e seus personagens me trouxeram vários flashbacks – e ao reconhecimento de vários cenários urbanos, como os do bairro boêmio de Barranco. Em seguida, li o livro de contos dele Punto de fuga, escrito antes, que comprova sua maturidade narrativa. Recomendo ambos.
Meus desacontecimentos foi, pra mim, o grande acontecimento de 2015 em termos de leitura. A repórter e documentarista Eliane Brum narra a descoberta e fascinação precoce com as letras, que moldou toda a sua trajetória de vida. História tocante, contada com emoção, domínio do idioma e apuro estético – aliás, marcas presentes em seus textos jornalísticos e de opinião. Meus desacontecimentos é o ganhador do DVeras Awards 2015. É um livrinho bom de ler anotando. Gosto muito deste trecho, entre tantos outros: “Meu pai pouco falava comigo pela boca, mas dizia muito com os olhos. Nas andanças pelo Brasil que, muito mais tarde, eu faria como repórter, escutei de homens e mulheres das mais variadas geografias uma expressão que revela a finura da linguagem do povo brasileiro: ‘Sou cego das letras’. Era como expressavam, em voz sentida, sua condição de analfabeto. Luzia, com esse nome tão profético, arrancou meu pai da cegueira das letras. E, com ele, todas as gerações que vieram depois. E as que ainda virão. Era isso que, ano após ano, ele agradecia à beira do túmulo de Luzia. E eu escutava, com os olhos”.
15
Mar15
Anotações de leitura: cuspe bom
“Comida gostosa, apimentada, temperos fortes. Para a saúde, vai ver não fosse bom, era reimoso; mas a mulher se ria, perto dela não se podia pensar em coisas mofinas. Achava fio de cabelo dela, não tinha repugnância, não se importava. – ‘Bem: eu cuspisse dentro da sopa, você tinha escrúpulo de tomar? Você gosta de mim de todo jeito?’ Asco nenhum. O cuspe dela, no beijar, tinha pepego, regosto bom, meio salobro, cheiro de focinho de bezerro, de horta, cheiro como cresce redonda a erva-cidreira”.
~ Guimarães Rosa. Dão-Lalalão (O Devente), em Noites do Sertão.
10
Feb15
DVeras Awards 2014: livros
No fim do ano passado, por causa das correrias de trabalho e viagens, deixei de publicar o DVeras Awards como de costume. Aí vai a categoria Livros, com algumas considerações preliminares.
- DVeras Awards é uma brincadeira com listas, baseada nas minhas preferências e simpatias.
- Os “concorrentes” na categoria Livros estão na lista dos lidos em 2014, incompleta por lapsos de memória, omissões de releituras e razões profissionais.
- O prêmio aos vencedores do ano é a eterna gratidão deste leitor.
- O resultado é irrecorrível, a menos que a comissão julgadora – eu mesmo – mude de ideia.
- Milton Santos é hors concours, porque o DVeras Awards se limita à ficção e ao jornalismo.
- Rubem Fonseca também é hors concours, pelo conjunto da obra. Amálgama, ganhador do Jabuti 2014, é um dos destaques do ano.
- Sua própria lista comentada dos 3+, ou quantos quiser, é muito bem-vinda.
Dito isto, vamos aos selecionados.
Em dezembro, li duas obras com qualidade acima da média, saídas das entranhas de seus autores: Zero zero zero, do jornalista italiano Roberto Saviano, corajosa radiografia dos cartéis internacionais da cocaína; e O irmão alemão, de Chico Buarque, viagem ficcional a uma curiosa história familiar, a partir de revelações da biblioteca do pai dele. O primeiro se destaca pelo excelente trabalho investigativo, nada fácil na sua condição de jurado de morte por causa de Gomorra. O segundo, pela inventividade e humor refinado. Empataram em terceiro lugar.
Em abril, tive o prazer de descobrir a talentosa contista canadense Alice Munro, ganhadora do Nobel de Literatura. O amor de uma boa mulher contém carpintaria literária de primeira, com histórias cotidianas que mergulham na alma das protagonistas. Quero mais Alice. Segundo lugar, e teria atributos para, tranquilamente, ser o primeiro, mas concedo o título a uma pequena joia na qual esbarrei em agosto. O DVeras Awards 2014 na categoria Livros vai para…
…Vinte contos de Truman Capote. O autor de A sangue frio, clássico do new journalism, tinha domínio vigoroso da técnica e da arte de contar histórias ficcionais – dizem que foi perdendo a mão no fim da carreira, mas deixo esse debate pros especialistas. São narrativas também situadas no contexto de banalidades do dia a dia, em que as emoções e contradições humanas afloram sem pieguismo, com timing preciso. Gostei demais de Um Natal, conto inspirado na infância do escritor e belíssima declaração de amor.
08
Feb15
Lendo: Meus desacontecimentos
“Desde pequena eu tenho muita raiva – e quase nenhuma resignação. A reportagem me deu a chance de causar incêndios sem fogo e espernear contra as injustiças do mundo sem ir para a cadeia. Escrevo para não morrer, mas escrevo também para não matar.
Ouvi de alguns chefes que a indignação faz mal para o exercício do jornalismo, que bom jornalista não tem causa. Discordo. Indignação só não faz bem para quem tem como única causa a do patrão.”
(…)
“Meu pai pouco falava comigo pela boca, mas dizia muito com os olhos. Nas andanças pelo Brasil que, muito mais tarde, eu faria como repórter, escutei de homens e mulheres das mais variadas geografias uma expressão que revela a finura da linguagem do povo brasileiro: “Sou cego das letras”. Era como expressavam, em voz sentida, sua condição de analfabeto. Luzia, com esse nome tão profético, arrancou meu pai da cegueira das letras. E, com ele, todas as gerações que vieram depois. E as que ainda virão. Era isso que,ano após ano, ele agradecia à beira do túmulo de Luzia. E eu escutava, com os olhos”.
~
Eliane Brum, uma das melhores repórteres do Brasil e escritora talentosa, em “Meus desacontecimentos – a história da minha vida com as palavras”
29
Jan15
Sobre reescrever: um bate-papo no Facebook
Já são 28 anos de profissão e alguns ensinamentos básicos não mudam. Na vasta maioria das situações, reescrever melhora o texto. As exceções são reservadas aos gênios.
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Confissão: quando reescrevo, às vezes mudo a fonte e o corpo do texto, pra dar a mim mesmo a impressão que é um outro. Truque bobo, mas legal. ”O outro” pode ser um outro texto ou um outro cara escrevendo. O que, no fundo, é o que ocorre. Depois que reescrevo um texto ruim, já não sou o mesmo. Ou, pra citar o Zé Dassilva, já não estou como cheguei.
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“Otto Lara Resende dizia que publicava livros pra se livrar deles”, lembra o Zé. A Fernanda Zacchi conta que Hemingway nunca amassava as folhas de rascunho, deixava que caíssem suavemente na lixeira, pois se ele mesmo não tivesse um mínimo de respeito pelo que escrevia, ninguém teria.
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Bukowski, entrevistado sobre o ato de escrever:
- Por que você escreve?
- Escrevo para ter uma função. Sem isso cairei doente e morrerei. É tanto parte de alguém como o fígado ou o intestino, e quase tão glamoroso quanto.
- A dor cria um escritor?
- A dor não cria nada, assim como a pobreza. O artista está lá primeiro. O que será dele está diretamente ligado à sorte. Se sua sorte é boa (falando literalmente), ele se torna um mau artista. Se sua sorte é ruim, ele se torna um dos bons. Em relação à substância envolvida.
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“Neruda simplifica”, cita o mano Camillo Veras: “Escrever é fácil. Você começa com letra maiúscula e termina com um ponto No meio você põe as ideias”. Provavelmente Bukoswki tinha tomado váaarias quando deu o depoimento, comenta a Nilva Bianco. Imagino que o Neruda falou essa tomando várias também. No barco-bar do jardim da casa dele em Isla Negra. Camillo completa: “Pra ser poeta e frasista e preciso tomar umas. Se não um bom vinho chileno, pelo menos uma boa cachaça cearense”.
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Reescrever demanda desapego pra render bem. Não me refiro só ao desafio de cortar. Também é duro se livrar das estruturas mentais que moldaram o texto original, testar outras aberturas, outros finais, mover blocos de frases ou parágrafos. O computador é uma mão na roda pra isso. Nenhuma saudade da máquina de catar milho.
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“E quem foi que falou que não existe texto pronto, existem textos abandonados? Lembro como de Gabriel Garcia Marquez”, diz o Rogério Mosimann.
13
Jul14
Copa 2014, um roteiro dos deuses
E hoje termina a Copa do Mundo de 2014. Lá no Olimpo da bola, os deuses roteiristas deste mundial estão inspirados. Derrubaram dois ou três monstros sagrados, elevaram seleções inexpressivas ao estrelato, adicionaram pitadas de canibalismo, traves no meio do caminho, injustiças, oportunismo político, apelo ao heroísmo, reversões de expectativas, lágrimas e consolações, piadas incríveis, thriller policial com fuga, teorias da conspiração, atos covardes e generosos, jogadas de marketing, pedidos de asilo, belíssimas panorâmicas com figurantes de todas as cores e sotaques. E bom futebol. Vi várias partidas bem jogadas – nenhuma foi do Brasil. Considerando o conjunto da obra, não dá pra me queixar. Que venha neste domingo um epílogo de tirar o fôlego. Sei que a memória é fraca e seletiva, mas espero lembrar da Copa de 2014 não só como a da destruição do mito da invencibilidade canarinha, que já não nos serve faz tempo, mas como um grande espetáculo.