Inovações sobre água atraem investidores
Por Dauro Veras
Para o Valor, de Florianópolis
Inovações relacionadas à água têm despertado grande interesse de investidores. Entre as pesquisas promissoras estão as que buscam avançar em técnicas de captação e armazenamento, redução de desperdício, tratamento de efluentes e descontaminação do subsolo. As soluções envolvem desde sofisticados produtos da biotecnologia até a sistematização de técnicas tradicionais como as utilizadas por agricultores no Semiárido. Um desafio é aproximar as instituições de pesquisa das fontes de financiamento e dos especialistas em gestão.
“Há um descompasso histórico no Brasil entre a destacada produção científica e o reduzido expertise em gestão”, diz Alexandre Alves, diretor da gestora de fundos Inseed, especializada em investimentos em inovação. A meta da Inseed é investir R$ 150 milhões até 2016 para apoiar 15 a 20 empresas que tenham faturamento anual de até R$ 20 milhões. “Nosso foco é o de soluções ambientais, e a água entra como elemento transversal nos projetos, pois é fundamental para quase todas as cadeias de valor industriais”, explica. Das 600 oportunidades analisadas em dois anos, três já renderam investimentos.
Um dos negócios apoiados pela Inseed é a Ecosynth, start-up de biotecnologia ambiental. Em outubro, a empresa recebeu a primeira parcela de um aporte de R$ 3 milhões que visa multiplicar por dez sua capacidade produtiva em dois anos. “Desenvolvemos um ativador metabólico que acelera a ação das bactérias sobre os resíduos industriais e sanitários, gerando uma economia de até 30%”, diz o diretor-presidente Eduardo Conchon. Entre os clientes da Ecosynth estão Tecnicor (Nike do Brasil), Ambev e L’Oréal. A multinacional francesa de cosméticos conseguiu reduzir em 90% a quantidade de lodo gerado na sua fábrica de São Paulo.
Uma bactéria marinha luminescente, a Vibrio fischeri, é a matéria-prima de produtos da Umwelt Biotecnologia Ambiental, de Blumenau (SC), para monitorar a toxidade de efluentes. “Atuamos em indústrias químicas, metal-mecânicas, têxteis, de saneamento e aterros industriais”, diz o diretor Gerson Zimmer. Entre as clientes da Umwelt está a Karsten, do ramo têxtil. “Conseguimos reduzir os custos com tratamento de efluentes e aumentar a remoção de cor já nos estágios iniciais do tratamento”, relata o coordenador de manutenção Dieter Schmeida. Na fabricante paranaense de papel Ibersul, um ajuste no sistema resultou em uma economia de R$ 360 mil. “Nossa eficiência passou de 30% a 80%”, informa a coordenadora de meio ambiente da empresa, Geslaine Secchi.
Outro destaque na biorremediação – tecnologia para reduzir ou remover contaminações da água e do solo com bactérias e enzimas – é o tratamento de águas subterrâneas. “Adicionamos nutrientes e oxigênio a uma ‘sopa’ de bactérias, que se multiplicam e degradam a poluição”, explica Sérgio Veríssimo, diretor da Inteligência Ambiental. Criada em 2012, a empresa tem parceria com a multinacional holandesa Biosoil em diversos projetos no Brasil e em outros países. “Estamos negociando o tratamento de áreas gigantescas contaminadas pelo petróleo no Kuwait durante a Guerra do Golfo”, conta. A companhia pretende abrir até 2016 um laboratório no Brasil para estudar bactérias tropicais.
Assim como o smart-grid na energia elétrica, a medição inteligente de água é uma tendência em crescimento. Estima-se que as concessionárias tenham perdas de 40% com vazamentos, desvios e submedição. Uma solução de smart water trazida ao país pela CAS Tecnologia pode reduzir essas perdas a 15%, por meio de um sistema de transmissão de dados que monitora continuamente a rede. No ano passado, a empresa paulista teve 15% do capital adquiridos pela norte-americana Sensus, que fornece a tecnologia para 450 clientes. “Estamos desenvolvendo projetos-piloto em quatro concessionárias de três estados, além de atuarmos na Espanha, Arábia Saudita e África do Sul”, informa o executivo Odair Marcondes Filho.
No nicho dos produtos economizadores de água, as inovações tecnológicas para uso doméstico costumam ser simples e acessíveis. “Lançamos uma ducha que acrescenta ar na água, seguindo o mesmo conceito dos arejadores em torneiras”, conta o diretor de marketing da Lorenzetti, Alexandre Tambasco. “Acrescenta-se volume ao fluxo, o que dá a sensação de maior de contato da água com o corpo – a estimativa é de uma economia de 40%”. Ele informa que 3,5% do faturamento da empresa vêm de produtos economizadores: “Ainda é pouco: pretendemos chegar a 5% este ano”.
Motivado um problema de saúde em sua família, o especialista em tecnologia e internet Celso Fortes criou um aplicativo para celulares que lembra a pessoa de tomar água. “No ano passado, uma filha teve uma grave infecção no rim”, conta. “Ela quase não tomava água – só um copo de manhã e um de noite”. A versão para iPhone do Beba Água, lançada em novembro, já teve 170 mil downloads e está entre os dez aplicativos mais vendidos na Apple Store. “Com os recursos, desenvolvemos uma versão gratuita para Android, que em duas semanas já foi baixada 5 mil vezes”, relata.
Uma versão condensada foi publicada no Valor Econômico em 21 de março de 2014