03
Aug10
As fotos do Yan
O amigo Yan Boechat acaba de inaugurar um saite de fotos. As imagens ainda não são definitivas e é preciso revisar os textos, avisa. Preocupação irrelevante, pois nada é definitivo enquanto se está vivo. A internet ficou mais rica com este presente que ele compartilha. Em suas andanças jornalísticas e vagabundísticas pelo mundo, Yan conseguiu capturar belezas raras, de lugares e gentes inusitados. Algumas fotos, como a do tanque russo abandonado no Afeganistão, quase foram suas últimas, pois ele caminhou sem saber por um campo minado pra chegar mais perto da carcaça de ferro.
Concordo com esse flamenguista de Itaperuna: suas melhores imagens são de gente. Que bom que ele conseguiu, como admite, superar a “covardia da tele-objetiva” e se aproximar das pessoas para fotografá-las. Assim capturou momentos especiais, como o da bilheteira de seios fartos num parque de diversões no Tocantins, o menino boliviano fazendo bola de chiclete, a mulher e a criança paulistas num abraço quente de olhos fechados…
O menu dá uma ideia da variedade de temas e lugares clicados: Gente; Lugares (eu botaria “Outros Lugares”, e no final da lista); Cotidianas; Copa sem Cor; Afeganistão; Angola; Patagônia; Irã; Bolívia; Rússia. Gosto em especial das suas fotos em preto e branco, com filme granulado. O cabra se dá ao requinte de ter um pequeno laboratório em casa pra revelar à moda antiga e ampliar sob a magia da luz vermelha.
Passeio pelas fotos e me bate um flashback da primeira vez que vi o Yan, em 1993, o ano em que ainda éramos magros. Na época ele era calouro de jornalismo na UFSC – curso que tem rendido muitas safras de profissionais criativos e talentosos, como Sonia Bridi, Celso Vicenzi, André Rohde, Marques Casara, Frank Maia e tantos outros. Eu, repórter de 27 anos (também formado na UFSC, na turma 91.2), tava numa fase de adrenalina e muitas andanças. Entre uma cerveja e outra, ele perguntava das minhas viagens pela América do Sul e Ásia. Seus olhos brilhavam e diziam sem dizer nada, “um dia vai ser minha vez”. Aí está, ele foi longe com seu espírito aventureiro. Vai mais ainda.
Faltou dizer: 1) a principal área de atuação do Yan na comunicação não é a fotografia, e sim a escrita. Grande contador de histórias! 2) Eu me orgulho muito de ser amigo desse cara de coração generoso e circunferência abdominal avantajada, pois de nada adiantaria tanto talento se ele fosse um filho-da-puta. Este é, portanto, um texto eivado pela parcialidade.
Segue na íntegra uma pequena biografia do repórter-fotógrafo por ele mesmo:
Eu sou flamenguista, em primeiro lugar. E isso diz muito sobre a pessoa de gosto refinado que sou. Minha maior influência em qualquer campo, seja artístico, seja intelectual ou até profissional, é o Flamengo de 81. Cartier-Bresson que me desculpe, mas se Júnior carregasse o filme, Andrade fotometrasse e Zico fizesse o enquadramento, ele e todos os outros gênios estariam um degrau abaixo no panteão dos grandes fotógrafos de todos os tempos. Essas fotos são uma tentativa de replicar, ainda que mal e porcamente, a beleza, a visão de jogo e a poesia daquele time, sem abandonar a virilidade de um Anselmo, que fique claro.
Comecei a fotografar na adolescência, com uma Ricoh. Fiz péssimas fotos com ela, mas até hoje dizem ser uma boa máquina. Quando entrei na faculdade de jornalismo, la em 93, comecei a fotografar com mais frequência e comprei uma Pentax K-1000, o grande fusca das máquinas fotográficas. A troquei por uma Nikon de foco automático que estragou poucos meses depois. E aí, sem câmera e sem dinheiro para comprar outra, fiquei anos sem fotografar.
Voltei em 2002, quando estava viajando. Foi um reencontro ótimo, porém intermitente. Abracei as digitais quando elas ficaram baratas e, com o tempo, fiquei com saudade do filme. E voltei a eles. Hoje praticamente só fotografo com filme. Montei um laboratório em casa e sempre que alguém vai viajar me faz a gentileza de trazer uns químicos e filmes. Com isso, fazer fotografia analógica não é tão economicamente imbecil como parece. E é uma delícia. Quase um Natal a cada filme. Sempre se está à espera do presente que vai vir.
Apesar de amar a fotografia, eu vivo de escrever. Sou jornalista e ando pulando de redação em redação pelos últimos 15 anos. Às vezes cansa, mas é divertido. Continuo tentanto, ainda sem sucesso, fazer na vida o que o Adílio, o Zico e até o Nunes fizeram em campo. Nesse momento dedico-me fervorosamente a ganhar na Megasena, mesmo que ela não esteja acumulada.