13

Jun

10

Cinema catarinense: Muamba

Na sexta-feira fui ao FAM (Festival Audiovisual do Mercosul) conferir a estreia do longa Muamba, dirigido pelo Chico Faganello, com roteiro dele e do Fábio Bruggemann. Eu já tinha visto o primeiro corte, que depois passou por algumas modificações, mas foi uma surpresa assistir ao resultado final na telona. Ficou bem bom! Muamba conta a história de um rapaz que trabalha como sacoleiro na fronteira Brasil-Paraguai, a serviço do pai dele, com quem tem uma relação conflituosa. O pai, colecionador de insetos, ganha um prêmio em um programa trash de tevê. Acompanhados do tio do rapaz, um padre hedonista, eles vão ao litoral buscar o prêmio, um carro usado.

Fernanda Franceschetto, Muamba

Fernanda Franceschetto, Muamba

Muamba é um filme estranho, como bem disse o Chico ao apresentá-lo no FAM – tão estranho quanto o objeto de cena que ele presenteou aos organizadores do festival, um porco-espinho luminoso. A narrativa convencional vai aos poucos abrindo espaço para imagens oníricas, com ecos de Kurosawa e Buñuel. Também tem momentos de humor ácido, tanto nos diálogos como nos pequenos detalhes. Numa das cenas, durante o programa de TV de baixíssimo orçamento, a apresentadora pergunta: “Você trabalha em quê, Lian?” Ele responde: “Comércio internacional no Mercosul”. Em outra, num típico puteirinho de interior, enquanto um sujeito de topete engraçado dança devagar com uma das garotas, lê-se o cartaz na parede pedindo: “Preserve a higiene: favor não cuspir no chão”.

O longa despertou em mim alguns ecos de infância, das minhas férias no sertão nordestino, embora a história se passe no Sul do Brasil: os cenários de casas do interior com paredes descascadas; os bibelôs e fotos antigas de família; os botecos decrépitos com mesa de sinuca, prateleiras semi-vazias, bodegueiros com camisa aberta e gente à toa biritando enquanto o tempo escorre com lentidão; o bêbado da vizinhança; a presença indígena, ao mesmo tempo humilde, forte e silenciosa… Quatro destaques da ficha técnica me chamaram a atenção: a fotografia de Marx Vamerlatti; a trilha sonora de Willy González; a montagem de Cíntia Domit Bittar e E. José, e a produção executiva de Licia Brancher. Esses são só alguns nomes de um time competente, que conseguiu continuar o trabalho mesmo com o imprevisto da enchente de 2008, que destruiu alguns lugares onde havia locações planejadas.

Chico acredita que Muamba pode representar um ponto de mudança pro cinema catarinense, pois sua distribuição vai priorizar caminhos alternativos nas novas mídias. Ele não fez um filme de fácil digestão. É daqueles que ao mesmo tempo fazem rir, causam incômodo, flertam com o absurdo e remexem em atavismos. A gente sai da sala de projeção lembrando de coisas que viu e do que não viu. E no dia seguinte, ainda fica com um gostinho de estranheza espalhado pelos cantos da memória. Em resumo, goste-se ou não, definitivamente é um obra de valor, com traços marcantes de autoria.

p.s.: Ter vários amigos na equipe que fez Muamba pode ter contribuído pra uma impressão favorável da minha parte? Não acho. Gostei porque gostei. Mas é legal que você saiba disso ao me ler: fiquei orgulhoso ao ver o resultado do trabalho deles.

p.s. 2: Imagem reproduzida do blog Cine Luz, de Fifo Lima.

Bookmark and Share


Não há comentários.


Comentar: