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Apr24
Hora de expediente
Uma crônica minha publicada em maio de 2015 na Fired, a revista do desempregado moderno.
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Hora de expediente
No intervalo do cafezinho, o chefe colocou a mão em seu ombro:
— Odair?
— Pois não, doutor Osvaldo?
— Quando terminar aí, dê uma passadinha na minha sala.
Uma hora depois, caminhava sem rumo pelas ruas do centro, o nó frouxo da gravata, a cópia do bilhete azul em uma das mãos, a pasta com documentos inúteis na outra. Na cabeça, alternava o mantra de um xingamento à genitora do doutor Osvaldo com a dúvida obsessiva: como eu vou contar pra Marlinda?
Tudo caminhava tão bem. Recém-casados, tinham acabado de comprar a tevê de tela plana em doze vezes, o carrinho japonês em quarenta e oito prestações, o guarda-roupas nas Casas Bahia, primeiro pagamento só depois do Carnaval.
Encheu a caveira no boteco e chegou em casa depois da novela. Marlinda o esperava na cama, de baby-doll transparente, segurando aquele vibrador duplo que compraram pela internet — seis vezes sem juros —, mas ele desmaiou ao lado dela para uma noite de sonhos inquietos.
Na manhã seguinte, acordou se sentindo um inseto de ressaca, barbeou-se, vestiu o terno cinza, beijou a mulher sonolenta e saiu. Na padaria, café com pão puro.
— Sem margarina é mais barato que sem manteiga — brincou com a balconista, pela força de hábito.
O que fazer? Enquanto pesava as alternativas, melhor não contar nada à mulher. Chegar em casa com um problema, em vez de uma solução? Para todos os efeitos, continuava empregado com carteira assinada. Como fora dispensado do aviso prévio, teria de arrumar o que fazer durante o dia, enquanto fingia que trabalhava. Menos mal que o Fundo de Garantia daria para os próximos dois ou três meses. Morrer de fome não morreriam, pois tinham o salário de Marlinda como operadora de telemarketing. Precisariam fazer alguns sacrifícios, claro, mas com um pouco de disciplina orçamentária, talvez nem fosse preciso devolver o vibrador.
Chegou à praça e se sentiu um pouco melhor. Ali seria o “escritório” ideal durante o horário do expediente. Sentou-se num banquinho, ao lado de uma pessoa que lia um jornal. Aquela mulher não lhe era estranha. Olhou por cima do jornal e tomou um susto:
— Linda?!
— Dodó?!
— Você não devia tar no trabalho?
— Benhê… Preciso estar lhe contando uma coisa…Perdi o emprego. Faz uma semana que venho aqui toda manhã matar o tempo e olhar os classificados.
— É mesmo? Eu também. Hoje é meu primeiro dia.
Caíram juntos na risada, se abraçaram e voltaram de mãos dadas para casa, onde curtiram uma sessão de sexo selvagem. No dia seguinte, Odair e Marlinda acordaram perto do meio-dia, vestiram as roupas de banho, colocaram o frescobol na sacola e foram à praia. Viveriam de amor.
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